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Patricia Lobaccaro

Seus centavos podem mudar vidas

ECOA

15/12/2019 04h00

E se aquelas moedas que a gente tem no fundo da bolsa, ou deixa cair pela calçada e nem se preocupa em pegar de volta, pudessem transformar a vida de alguém? Arrecadações de moedas em cofrinhos não são nenhuma novidade, mas nessa época em que moedas físicas estão caindo em desuso, surgem diversas opções de cofrinhos virtuais, que têm enorme potencial de crescimento. E em um momento em que o financiamento para projetos sociais está minguado e as organizações estão precisando se reinventar e diversificar fontes de recursos para conseguirem manter seus projetos, o arredondamento de centavos pode ser uma alternativa valiosa. 

No Brasil, a cada minuto são realizadas 36 mil transações em cartão de crédito. No ano passado foram feitas quase 10 bilhões de transações em apenas uma das bandeiras do mercado de cartões de crédito. Se cada transação dessa única empresa tivesse um arredondamento de 10 centavos, estaríamos falando de 1 bilhão de reais em doações. O e-commerce no Brasil também vem ganhando peso – a BlackFriday cresceu 23% com relação ao ano passado, totalizando mais de 5 milhões de pedidos feitos e 3.2 bilhões de reais movimentados somente via e-commerce. Se conseguirmos conscientizar os lojistas a habilitarem as doações de troco em suas lojas físicas e virtuais, isso pode representar uma importante fonte de recursos para as organizações da sociedade civil.

Uma das iniciativas pioneiras de "troco solidário" no Brasil é o Movimento Arredondar, que surgiu em 2011 com o objetivo de tornar o ato de doar mais fácil e acessível, fortalecendo a cultura de doação no país. Desde então, o Arredondar – que tem parceria com grandes lojistas como Pão de Açúcar e Burger King – já arrecadou mais de R$ 4 milhões de reais distribuídos para mais de 50 organizações atuantes em diferentes causas.  Para instituições sem fins lucrativos, a doação de troco pode ser uma fonte de receita imprescindível. Um exemplo é o Hospital da Baleia, em Belo Horizonte, que já arrecadou mais de 10 milhões de reais através de troco solidário, em parceria com a rede de lojas da Drogaria Araújo.

Uma outra iniciativa é a Pólen, plataforma que surgiu com o objetivo de descomplicar iniciativas corporativas de impacto, criando mecanismos para lojas físicas, virtuais ou aplicativos doarem uma porcentagem das duas vendas. Desde 2017, 230 lojas cadastradas contribuíram com 500 mil reais em apoio a 100 projetos diferentes. O "Bom Troco", ferramenta lançada pela Pólen recentemente, também oferece a opção de arredondamento de centavos.

Já a plataforma inCENTive tem uma outra abordagem: promover o engajamento a partir do  doador que cadastra seu cartão de crédito a uma determinada causa ou instituição de sua escolha, independentemente de onde fizer as compras. O usuário recebe mensalmente extratos das suas compras feitas no cartão, o valor de cada arredondamento e o total doado para a instituição escolhida. Uma das campanhas mais inspiradoras que vi ultimamente é a Centavos Realizam Sonhos, feita pela Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), que desde 1950 trabalha com inclusão de pessoas que apresentam algum tipo de deficiência. Os centavos que muitas vezes são ignorados, quando somados, podem mudar a vida de uma pessoa.

Hoje em dia se fala muito da experiência do usuário. Pensando nisso, o processo de doação precisa ser simples, intuitivo e transparente. Essas plataformas são bastante sofisticadas em termos de transparência e facilmente adaptáveis a novos conceitos de tecnologia, como o blockchain. Tais ferramentas ampliam a possibilidade de arrecadação, de maneira quase imperceptível para quem colabora. O brasileiro é solidário e disposto a contribuir, mas às vezes por falta de tempo e canais que possibilitem doações de maneira fácil, acaba não se engajando como deveria.

É importante conscientizar os lojistas a habilitarem esse tipo de ferramenta e os clientes a participarem sempre que possível.

O que é invisível para muitos, pode mudar a vida de outra pessoa. Nesse final de ano, que é uma época de compras, que tal arredondar os seus centavos e fazer a diferença na vida de alguém? 

Sobre a Autora

Patricia Lobaccaro construiu carreira no campo do investimento social, articulando redes e iniciativas para fortalecer projetos transformadores no Brasil. Foi presidente e CEO da BrazilFoundation de 2010 a 2019, mobilizando mais de 35 milhões de dólares em apoio a mais de 500 organizações da sociedade civil no Brasil. Atualmente Patricia atua como consultora no setor social e faz parte do conselho de instituições sem fins lucrativos. É formada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo e fez curso de gestão em non-profits em Harvard.

Sobre o Blog

A palavra filantropia tem origem grega e vem das expressões philos, que significa “amor”, e anthropos, que significa “ser humano”, ou seja, amor ao ser humano ou amor à humanidade. A expressão carrega em sua origem a intenção de ajudar ao próximo, “fazer o bem” e doar. Este blog é um convite para um cafezinho e um bate-papo sobre filantropia e impacto socioambiental. Tem como objetivo contar histórias de empreendedores sociais, filantropos e pessoas comuns impactando positivamente comunidades ao redor do Brasil e do mundo. E, por meio dessas histórias, inspirar mais pessoas a agirem por um mundo melhor.